A PAREDE DE FELLINI


Ontem fui fotografar na Tratoria Mellão, do meu amigo Hamilton Mellão. Fazia algum tempo que não o encontrava. Além de um enorme prazer em encontra-lo, estar naquele templo ao cineasta Federico Fellini é muito bom. Ali até paredes são forradas com desenhos do Italiano, fotos e cartazes dos seus filmes.
Aliás, desde que o conheci há muitos anos atrás, já era fanático pelo diretor de cinema. Sua pequena rostisserie e masseria no bairro Pinheiros se chamava I Vitelloni em homenagem ao filme.
Dos fundos da loja saiam massas de todas as cores, tingidas com cenoura, beterraba, espinafre, etc. Na loja uma grande prateleira ocupava toda sua parede esquerda cheia de livros e publicações para quem quisesse consultar. Muitos, inclusive eu, aprenderam as bases da gastronomia lendo da biblioteca do Mellão.
Trabalhamos muitas vezes juntos para a Revista Gourmet, a mais importante revista de cozinha e a única revista dedicada à nascente Gastronomia do país na época. Era divertidíssimo. Ele nunca se conformava com o convencional, precisava inventar.
A carreira do chef começou no curso de cozinheiro no Senac, passou pelo Massimo Ferrari, um grande privilégio, depois foi trabalhar com Leo Filho no recém-inaugurado Maksoud Plaza.
Em 1992 passou para o outro lado da rua e numa travessinha abriu a Pizzaria I Vitelloni. Lugar mínimo, que depois adicionou o imóvel ao lado para virar muito pequeno. Era um lugar onde conviviam uma grande bandeira do Palmeiras e dois grandes quadros, um de uma mulher pelada deitada em um divã comendo pizza e outro de um navio com casco preto navegando como nos filmes de Fellini.
Mellão tinha pizzas Marguerita, calabresa, etc, mas o bom lá eram as misturas inusitadas que saiam da cabeça do agora Pizzaiolo. Ele tem coragem mesmo. Suas pizzas tinham, abobrinhas, aspardos e até tomate seco, iguaria na época. Foi nesta pequena pizzaria que foi criada a pizza de rúcula com tomate seco, hoje muito popular e espalhada por todo o país.
O projeto do “Mellão cuccina d’autore” durou pouco, mas deixou boas lembranças para muita gente. O cardápio mudava diariamente de acordo com o que tinha no mercado, basicamente o de Pinheiros. Era incrível. Mellão sempre foi atrevido. Teve um momento que quem tocava a cozinha era o Luigi Tartari, o chef italiano mais importante da época.
Hoje Mellão mantém um pequeno restaurante no Itaim que carrega seu nome. A comida é clássica e impecável com inovações aqui e ali. Uma grande experiência passar um tempo por lá.